"[...] a génese da personalidade de Fernanda de Castro dá-se num ambiente dominado claramente pelo feminino - mulheres que, de maneiras diferentes, são fortes e determinantes no prosseguimento da vida doméstica, ou que simplesmente estão presentes e compõem, com a sua presença e a sua sensibilidade, um ambiende cor-de-rosa (como a casa de família). Tal facto gera nela uma reacção imediata e uma acção a longo prazo: a primeira é a de ser uma «Maria rapaz», um «cabrito montês» que sempre sonhou com aventuras em cavalos de papelão ou em aventuras pela quinta liderando irmão e primo, mais que com delicados chazinhos para as bonecas. A longo prazo determinou, pouco depois da morte da mãe, que Fernanda de Castro se assumisse como a nova dona de casa, a quem competia gerir o ambiente familiar, e que por toda a vida - em tudo aquilo que fez - fosse profundamente feminina, num mundo de homens. Entre um e outro módulo, está a verdadeira Fernanda de Castro - aquela que se refugiava com os seus livros e os seus papéis no velho sótão, no isolamento e na solidão em que afinal, apesar de sempre e tão bem rodeada, viveu toda a vida. Fosse um limbo de educação e geração, de pudor de se revelar selvaticamente esse cavalo a galopar ou esse cabrito a dar coices, fosse um medo qualquer do tempo e do meio em que viveu, a verdade é que a distância a que manteve sempre todas as pessoas, mesmo as mais chegadas, foram fortificando essa sua «Ilha da Grande Solidão»."
Francisco de Almeida Dias, O Diálogo das Artes no Feminino: Fernanda de Castro e Sarah Afonso, duas mulheres de grandes maridos. (2006)
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